quarta-feira, 25 de junho de 2008

Amor que deixa a desejar.

O amor já teve um toque sagrado, a magia de uma inutilidade deliciosa, já foi um desafio do dia-a-dia que nos tirava da vida comum. Não existe mais o amante definhando de solidão, nem romeus nem julietas, nem pactos de morte, não existe mais o amor nos levando para uma galáxia remota, a uma eternidade semi-religiosa. O amor tinha uma fome de compaixão pelo outro, de proteção à pessoa amada. Isso está acabando. O rito do tempo atual acelerou o amor, o dinheiro contabilizou o amor, matando seu mistério impalpável. Hoje, temos controle, sabemos por que "amamos", temos medo de nos perder no amor e fracassar no mercado. O amor pode atrapalhar a produção.
A publicidade devastou o amor, falando na "gasolina que eu amo", no sabonete que faz amar, na cerveja que seduz. Há uma obscenidade flutuando no ar o tempo todo, uma propaganda difusa do sexo impossível de cumprir. Como comer todas as moças da lingerie e do xampu, como atingir um orgasmo em pleno e definitivo? A sexualidade é finita, não há mais o que inventar. Já o amor, não... O amor vive da incompletude e esse vazio justifica a poesia da entrega. Ser impossível é sua grande beleza. Claro que o amor é também feito de egoísmos, de narcisismos mas, ainda assim, ele busca uma grandeza - mesmo no crime de amor há um terrível sonho de plenitude. Amar exige coragem e hoje somos todos covardes.
Estamos com fome de amor cortês, num mundo em que tudo perdeu a aura. O terrível bombardeio que a cultura americana está fazendo nos sentimentos é invisível, mas é pior que as bombas contra o Iraque. A cultura americana está criando um "desencantamento" insuportável na vida social. Tudo é tolerável, num arrasamento de mistérios. Vejam a arte tratada como algo desnecessário, sem lugar, sem uso, vejam as mulheres amontoadas na internet, nuas, com números - basta clicar e chamar. Estamos com fome de infinito em tudo, na vida, na política, no sexo. Estamos virando coisas. Precisamos aprender a amar de novo as pedras, as árvores, as nuvens, até chegarmos a nós mesmos... E acho que isso vai surgir na América, como foi nos anos 60 - A luta pelos direitos civis será agora a luta pela beleza da inutilidade.

Acho que viajei demais.

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