quarta-feira, 25 de junho de 2008

O mundo de hoje, é travesti.

Essa história toda de saber "como se faz uma cirurgia de mudança de sexo", me deixou com uma luz, mas meio estranha. Não que eu queira mudar de sexo, longe disso, eu gosto do meu clitóris, mas cada um no seu quadrado. Enfim, aulas de anatomia me dão uma luz, portanto vou falar um pouco besteiras pra descontrair esse clima de "corna mansa".

Acho os travestis figuras shakespearianas, de grande dramaticidade, centauros urbanos, corajosos, encarnando duas vidas num corpo só. Como pode. Os travestis almejam uma beleza superior, uma poesia qualquer insuspeitada, mesmo que movidos pela necessidade da grana do michê. Não confundir o travesti com a drag queen. A drag queen é satírica, caricatura de uma impossibilidade; o travesti é idealista. O travesti acredita na arte. É utópico e romântico (não que eu já tenha tido um caso com algum, longe disso). O travesti tem orgulho de ser quem é; ele não é uma decaída - ele tenta ser uma afirmação de identidade.
Na realidade, o travesti é uma espécie de ideal das mulheres, principalmente das pós-peruas, das turbinadas e siliconadas, pois elas querem ser homens também, homens macios. Elas aspiram à coragem e à liberdade do travesti, sem pagar o preço das ruas, pois o travesti sempre encerra um perigo qualquer. Eles não têm a mansidão aparente das damas da noite. O travesti é um risco maior que a AIDS. Eles têm algo de homem-bomba - carregam um segredo que pode te matar ou te mudar para sempre. O travesti não enfrenta a moral vigente; ele enfrenta a biologia. A garota de programa é conservadora, serve ao sistema sexual vigente. O travesti é revolucionário, quer mudar o mundo. O viado ama o homem; o travesti ama a mulher, mas ele não quer ser mulher, ele quer muito mais, ele não se contenta com pouco, ele é barroco, maneirista (não existem travestis clássicos).
Há algo de clone no travesti, algo de robô, pois eles nascem de dentro de si mesmos, eles são da ordem da invenção. O travesti não quer ter uma identidade; ele almeja uma ambigüidade sempre deslizante, sempre cambiante, se parindo numa estirpe futura de neoloucos. O que oferece o travesti ao homem que o procura? Oferece-lhe a chance de ser mulher de uma mulher, oferece-lhe um pênis dissimulado. O travesti que se opera perde sua maior riqueza.
Nada mais triste que o travesti castrado; não é mais homem nem mulher. Vira nada. Passa a existir só em sua fantasia.
O travesti nunca será grato a você; você é que terá de lhe agradecer. O travesti não dá uma boa esposa; voc~e é que poderá a virar uma boa esposa para ele: "Querida, já lavei a sua minissaia de oncinha..."
Todos somos ingênuos e caretas vistos daquele ângulo, mas todos somos travestis: "maus" vestidos de "bons", idiotas vestidos de sábios, egoístas de generosos, bichas de machões. O travesti me fascina porque assume a verdade de sua mentira.



"Eu me imagino inteiramente liso para iniciar o parto, como alguém raspado antes de uma cirurgia e, de dentro de meus membros, começa a surgir um outro corpo..."
Suzane,19 anos, travesti.

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